Enquanto países desenvolvidos como Estados Unidos, Canadá e
a maioria dos europeus apresentaram os índices mais baixos de poluição, entre 5
e 20 microgramas de material particulado inalável por metro cúbico de ar
(μg/m3), as nações em desenvolvimento, que estão concentradas na América do
Sul, no Norte da África e nas regiões próximas à Índia e à China, ficaram nas
faixas mais altas, entre 71 μg/m3 e 142 μg/m3. A recomendação da OMS
(Organização Mundial da Saúde) para o poluente são valores abaixo de 20 μ/m3.
Para Lais Fajersztajn, principal autora da pesquisa, os
resultados indicam que a ciência é uma ferramenta importante para mudar esse
cenário e precisa ser fortalecida nos países em desenvolvimento por
colaborações internacionais.
“Vale dizer que os dados ainda são subestimados, pois
consideram regiões muito grandes e diversas.
O Brasil, por exemplo, está na
mesma faixa dos Estados Unidos, que é a mais baixa. Mas é uma média de todo o
país, que tem lugares muito poluídos e outros pouco poluídos”, afirmou Lais.
De acordo com Paulo Saldiva, do Laboratório de Poluição
Atmosférica Experimental da Faculdade de Medicina da USP e orientador de Lais
no estudo, o mapa da poluição mostra que as regiões com pior qualidade do ar
são também as mais densamente povoadas.
Para fazer a comparação, o grupo cruzou os dados sobre
densidade populacional e poluição atmosférica, disponíveis no site do Banco
Mundial, com a base de dados Web of Science, índice de citações online mantido
pela Thomson Reuters.
O levantamento mostrou que as pesquisas sobre o impacto do
ar poluído na saúde estão concentradas na América do Norte e na Europa,
seguidas por China, Austrália, Brasil e Japão, e é quase inexistente na África,
na Índia e nos demais países da América do Sul.
“Alguém pode argumentar que alguns desses países são tão
pobres e têm tantos problemas que não teriam condições de produzir conhecimento
científico sobre qualquer assunto. Então, para comparar, buscamos também as
pesquisas publicadas sobre malária e sobre qualidade da água”, explica.
Segundo Lais, os resultados mostraram que 20% das pesquisas
sobre qualidade da água e 70% dos estudos sobre malária foram feitos nos países
em desenvolvimento.
Os pesquisadores ressaltam ainda que o número de mortes
prematuras causadas pela poluição do ar tende a superar o de mortes por malária
e por falta de saneamento básico nos próximos anos. Segundo estimativa da
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico, a exposição a
poluentes vai se tornar a principal causa ambiental de morte prematura até
2050.
CÂNCER DE PULMÃO – Há evidências científicas que relacionam
exposição à poluição a elevação no risco de doenças cardiovasculares, problemas
respiratórios e vários tipos de câncer. No artigo científico, o grupo da USP
reuniu os principais estudos que mostram como poluentes aumentam o risco de
câncer de pulmão.
O trabalho mais recente, publicado este ano no The Lancet
Oncology, traz dados de mais de 300 mil indivíduos em nove países. Os
resultados indicam que, no grupo exposto à poluição, o risco de câncer se eleva
em 50% a cada 10µg/m3 inalado.
Embora o risco causado pela poluição não seja tão alto
quando comparado ao tabaco, que chega a elevar em 30 vezes o risco da doença,
ainda é um problema de saúde pública importante, pois toda a população está
exposta.
O gráfico também indica que os benefícios da urbanização
estão distribuídos de forma altamente desigual no mundo. Esse fenômeno, que
Saldiva chama de ‘racismo ambiental’, tem grandes impactos sobre a saúde da
população de países em desenvolvimento.
“Medidas de política pública são a única forma de proteger a
população. É a vacina moderna. Não tem nada que os indivíduos possam fazer de
forma isolada”, diz Saldiva. (Fonte: Agência Fapesp)